puniçãoGostaria de, através dessa coluna, levá-los a uma reflexão e, ao mesmo tempo, chamá-los a um debate sobre a atual situação da sociedade. Os atos de vandalismo cometidos em São Januário no sábado passado são reflexo do atual momento vivido por nós. Será que é justo punir o Vasco “exemplarmente” e não os torcedores envolvidos? É justa a interdição do estádio?

O filósofo Jeremy Benthan disse certa vez que “toda punição é maldade; toda a punição em si é má”. A afirmação de Benthan nos faz refletir sobre a interdição imediata de São Januário devido aos episódios lamentáveis ocorridos no jogo contra o Flamengo. Essa interdição foi um duro golpe aplicado, haja vista o bom aproveitamento do Cruzmaltino em casa. Cabe salientar que o julgamento da perda ou não dos mandos de campo será na próxima segunda-feira.

O próximo jogo com mando do Vasco será no Estádio Nilton Santos com portões fechados. O Clube e sua torcida já foram punidos antes do julgamento. A CBF, logo no dia seguinte ao jogo, emitiu uma nota proibindo o estádio de São Januário de receber público em qualquer partida de competição organizada por ela até decisão posterior do Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Segundo a nota do presidente da entidade, Marco Polo Del Nero, não está permitida “sob nenhuma hipótese” a presença de torcedores. Pouco depois, o STJD se posicionou sobre a situação. O Tribunal acatou o pedido de interdição feito pela Promotoria e Paulo Salomão Filho, presidente em exercício, assinou o despacho que impede partidas em São Januário. Além disso, a pena máxima para o Vasco pode ser de R$ 350 mil de multa e 25 jogos de perda de mando de campo. O Código Brasileiro de Justiça Desportiva, nos incisos I e III do artigo 213, diz que são possíveis 20 perdas de mando no total, além de multa de até R$ 200 mil. No inciso II do mesmo artigo, pela tentativa de invasão de campo fica sujeito à pena de metade da máxima, ou seja 5 jogos e até R$ 50 mil. No pior dos cenários, seríamos punidos com 25 jogos sem mando de campo.

A própria mídia martelou muito o assunto, e sabemos que no Brasil o Judiciário recebe uma influência absurda dos aparelhos  midiáticos. Na maioria das vezes, se pune sem levar em consideração o contraditório e a ampla defesa. Em sua obra intitulada “O Espírito das Leis”, Montesquieu defende que cabe ao legislador a tarefa de educar, pois a punição seria aplicada apenas em último caso, ou seja, uma exemplar punição só seria aplicada se o magistrado tivesse a certeza de não haver outro jeito, seria a última ratio. Entretanto, cabe uma reflexão: como o Judiciário educará se na maioria das vezes age sem isonomia? Como educar uma sociedade doente?

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O episódio lamentável do último sábado vai muito além da depredação do patrimônio cruzmaltino e da briga entre os torcedores. O ocorrido é o reflexo de uma sociedade anômica. Listo alguns motivos que levaram nossos torcedores à selvageria: insatisfação com o resultado, brigas políticas, exagero nas ações da PM, flamenguistas infiltrados, etc. Quero levá-los à reflexão, a pensar fora do viés futebolístico e observar o momento social em que vivemos.

Nesse campeonato, já tivemos vários casos de violência entre torcidas. Na quarta-feira mesmo, após a repercussão dos acontecimentos em São Januário, tivemos brigas entre os torcedores de Fluminense e Botafogo aqui no Rio e a morte de um torcedor em confrontos entre as torcidas de Corinthians e Palmeiras, em São Paulo.

Vivemos no chamado pós-modernismo, que leva a sociedade a recusar qualquer tipo de debate (nossa direção é o grande exemplo disso), relativizando a vida ao máximo. Dentro dessa super-relativização, não conseguimos estabelecer críticas nem formar regras gerais, pois, na maioria da vezes, as pessoas agem de acordo com seus impulsos. Somos uma sociedade líquida (segundo Zygmunt Bauman), com relações fluidas e frágeis. O hedonismo pós-moderno, fantasiado de livre-escolha, de “se não gostar do programa, então desligue a televisão”,  em que parecemos ser reis de tudo aquilo que chega até nós, é, primeiramente, uma condenação da sociedade. Construímos um mundo onde o mal estar se agravou e se delineou em novas e importantes categorias psiquiátricas, como a síndrome do pânico e a depressão.

Concomitantemente a isso, não se pode negligenciar a crise na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. O próprio Secretário de Segurança admitiu isso em uma entrevista: “O Brasil vive uma crise na segurança pública. E o estado vive uma crise econômica, tanto que está decretada a calamidade financeira, e isso se reverte na falta de recursos. Hoje eu tenho quatro mil aprovados, candidatos à PM aprovados, e não consigo contratar. Não posso. Tenho que fazer manutenção dos blindados, tenho algumas dificuldades. Mas isso não é impedimento para a polícia demonstrar o espírito público que tem. É premissa básica, diretriz número um do meu compromisso é a redução da letalidade violenta e controle da criminalidade”. Olha a que ponto chegamos! O próprio secretário “evoca” o espírito público para que seus comandados nos protejam.

Cabe salientar que no jogo de sábado um torcedor do Vasco foi baleado e veio a óbito. Não vi praticamente em lugar algum um clamor pela punição dos responsáveis (torcedores) que são facilmente identificáveis na confusão. A Inglaterra hoje é um exemplo de civilidade nos estádios, porém nem sempre foi assim. Medidas drásticas foram tomadas. Tem torcedor que nem pode mais frequentar um jogo de futebol por causa de brigas. Lá, quem se envolve em confusões é EXEMPLARMENTE PUNIDO. Em alguns casos, pune-se o clube, mas os arruaceiros identificados recebem a maior pena.

Enfim, como punir o Vasco?

Nosso Clube tem que ser tomado como bode expiatório em uma pena exemplar por causa de um grupelho de arruaceiros? Na minha opinião, o Vasco deve ser punido sim, mas com alguma ressalvas. O momento social delicado em que vivemos deve ser levado em consideração e o Clube não deve ser tomado para Cristo nesse processo.  A punição deveria ser aplicada de forma mais rigorosa aos torcedores, pois mesmo com todos os laudos e exigências garantindo a segurança do estádio, bandidos fizeram aquilo. No atual cenário que estamos vivendo, e com os possíveis motivos citados acima, era inevitável.

Concordo com Benthan quando diz que é através da pena que se deve agir para manter a ordem e a felicidade da sociedade, mas para julgar o ato é necessário avaliar a soma das diferenças entre as consequências de um ato bom ou mau.

/+/ Saudações Vascaínas /+/