Meu pai tem 80 anos. Ele é rubro-negro (fazer o quê, ninguém é perfeito), mas ao perceber que seu primogênito optou pelo Vasco, mostrou-se altruísta ao descrever para mim sua admiração, na juventude, pelo chamado “Expresso da Vitória”, como ficou conhecido o time cruz-maltino na decáda de 1940, muitas vezes campeão carioca e até do continente. O sr. Mauro (pai) sabe até hoje, de cor, o “11” do “scratch” mais vencedor da História do Vasco: Barbosa; Augusto e Clarel; Ely, Danilo e Jorge; Friaça, Ipojucan, Ademir, Maneca e Chico.

Ele me contou, ainda, que o Gigante da Colina era tão bom que constituiu a base da Seleção Brasileira que disputaria o Mundial de 1950: Barbosa, Augusto, Danilo, Maneca e Chico, além dos reservas Ely e Alfredo. Até o técnico vascaíno daquele time, Flávio Costa, foi o escolhido para comandar a seleção anfitriã da primeira Copa do Mundo pós-Guerra.

Logo na estreia, um acachapante 4 a 0 sobre o México (nosso eterno freguês em Copas), com 2 gols de Ademir. Parênteses: meu pai conta que o “Queixada”, apelido do artilheiro vascaíno, era tão importante para o Vasco nos anos 40 que o então técnico tricolor Gentil Cardoso, cobrado pela ausência de títulos, disse aos seus patrões: “Deem-me Ademir e seremos campeões”. Pois não é que ele foi contratado pelo time das Laranjeiras e foi campeão também por lá? Felizmente, antes da Copa, voltou para São Januário.

Continuando sua campanha no Mundial, após um empate com a Suíça (com mais um gol vascaíno, anotado por Alfredo), o Brasil retomou o caminho das vitórias com um triunfo sobre a Iugoslávia. Outro gol de Ademir. Este jogo foi realizado no Maracanã diante de um público de mais de 140 mil torcedores. Dentre eles, meu pai.

Classificado, o Brasil disputaria então um quadrangular final (naquele Mundial não havia uma fase eliminatória em jogo único). No primeiro dos três jogos decisivos, um placar que viria a ser icônico: 7 a 1. Na ocasião, a nosso favor. A vítima, a Suécia (outra freguesa histórica), levou todos os gols de jogadores vascaínos – 4 de Ademir, 2 de Chico e um de Maneca. Nunca um mesmo time teve tantos gols marcados por seus jogadores em um único jogo de Copa.

Na segunda peleja dessa fase, nova goleada: 6 a 1 sobre a Espanha. Ademir (2) e Chico (2) anotaram gols nesta partida que fez a torcida cantar o sucesso carnavalesco da época, “Touradas em Madri”, num Maracanã mais uma vez lotado.

Aí veio o Maracanazo. Meu pai conta que a decepção da torcida com a virada uruguaia e a perda do título mundial foi inesquecível. Barbosa, o “goalkeeper” (como eram chamados os goleiros na época), foi considerado pela imprensa como o principal culpado pela derrota – e carregou essa mágoa por décadas, até sua morte. Mas o fracasso da Seleção Brasileira não minou a carreira dos craques vascaínos, que no campeonato carioca do mesmo ano de 1950* viriam a conquistar, também no Maracanã, mais um título.

Na próxima terça-feira, o último episódio da série “Saudações Vascaínas na Copa”.

* a final do Campeonato Carioca de 1950 foi disputada em janeiro de 1951.

pai

Mauro pai e Mauro Filho